lookleft

 

1. No dia 14 de dezembro de 2013, os militantes do Bloco de Esquerda foram surpreendidos com o anúncio, através da comunicação social, do lançamento de um manifesto que se propunha agregar Bloco de Esquerda, LIVRE, ex-militantes do PCP e outros cidadãos sem vinculação partidária.

Segundo a imprensa, Carvalho da Silva lideraria este grupo com o propósito político imediato de criar uma lista candidata ao Parlamento Europeu da “esquerda situada entre o PS e o PCP”. Avançou-se ainda que já teriam sido realizadas “reuniões para a elaboração do manifesto, que têm incluído quer representantes do Bloco de Esquerda, quer do grupo de pessoas que está a constituir o LIVRE”.

Nesse mesmo dia, Carvalho da Silva viria desmentir as notícias: “não criei nem tenciono criar nenhum movimento”. Três dias mais tarde é apresentado formalmente o Manifesto 3D – Dignidade, Democracia e Desenvolvimento – contanto com o nome do antigo chefe máximo da CGTP entre os primeiros 65 subscritores.

2. As linhas mestras foram assim enunciadas: construir uma lista com Bloco, LIVRE, Renovação Comunista e outros cidadãos para as eleições europeias. Adiantou-se o projeto de construção de um espaço político para as próximas eleições legislativas, que se proponha a celebrar um acordo político com o PS.     

No dia 7 de janeiro, o manifesto 3D comunica que recolheu mais de cinco de mil assinaturas e que pedirá reuniões ao Bloco de Esquerda, Renovação Comunista e LIVRE para formalizar a proposta de candidatura conjunta às europeias. É adiantado que o grupo irá elaborar também uma proposta de convergência que “perspetive uma estratégia de Governo para um país diferente”, sendo a candidatura conjunta ao Parlamento Europeu apenas um primeiro passo nessa direção.

Tidas as respetivas reuniões, é comunicado que o processo de convergência falhou. A direção do Bloco de Esquerda não aceitou fundar um novo partido, que assumiria o papel de envelope, para posteriormente se coligar com ele, já nas eleições de 25 de maio, nem coligar-se com o LIVRE, como era proposto pelo 3D, nem os proponentes do manifesto aceitaram integrar-se na candidatura do Bloco, sob a forma de um “acordo político em torno de uma plataforma programática e de um compromisso de candidatura”.

3. Na Mesa Nacional de 25 de janeiro, Ana Drago apresenta a sua demissão da Comissão Política alegando que o “Bloco de Esquerda não se mostrou disponível para iniciar um debate programático com alguns dos possíveis participantes nessa convergência” e que “se não for com estes atores, não se fará convergência com ninguém”, ficando “o Bloco sem qualquer estratégia de alargamento e convergência”. Drago, reforçou ainda que a unidade de esquerda é “urgente” e que deve “ser mais ampla”.

Por seu lado, o coordenador do Bloco, João Semedo assume na comunicação social que há no 3D “importantes posições programáticas do Bloco de Esquerda” e Fernando Rosas explicita num artigo no Público que “se os promotores do Manifesto 3D se constituíssem como partido, o Bloco proporia uma coligação eleitoral com base na proximidade evidente de propostas programáticas de resposta à situação atual que entre as duas entidades existe”. Por sua vez, o Manifesto 3D destaca a existência de uma “concordância de princípio”, apesar do projeto político para as eleições europeias ter gorado.

4. Analisados os factos e os diversos episódios, podemos concluir que os objetivos do movimento 3D são essencialmente dois: fazer uma OPA sobre o Bloco de Esquerda; forçar uma convergência para as eleições legislativas que permita a reclamada governabilidade com o Partido Socialista ao leme. Sendo complementares e concomitantes, o primeiro é essencial para o triunfo do segundo.

A matriz fundacional do Bloco de Esquerda tem conduzido o nosso partido/movimento para a ação política, tendo em vista a construção de uma alternativa socialista e popular ao rotativismo ao centro e não a procura de espaços de entendimento para uma “governabilidade alternativa” com o Partido Socialista.

Podemos mesmo afirmar, que um Bloco à esquerda é um obstáculo permanente para quem entende não existir alternativas à esquerda que não passem pela participação em governos com defensores da austeridade light. Assim, entende-se a enorme pressão que tem sido exercida sobre o Bloco de Esquerda e a sua linha política.

5. Apesar da aparente acalmia, o pós-eleições europeias será palco de novas agitações e pressões sobre o Bloco de Esquerda, como fizeram saber os próprios membros do 3D. A 28 de janeiro, Ricardo Paes Mamede, dirigente do 3D, declarou à imprensa estar “tudo em aberto” para as legislativas, reafirmando que o objetivo da convergência “foi abraçado por todos os nossos interlocutores” e que pretendem chegar “às legislativas com uma alternativa de governação”.

Não acontecendo previsivelmente no tempo que dista até às eleições legislativas uma reconfiguração do mapa político, a participação numa solução governativa passa necessariamente por um entendimento pós-eleitoral com o Partido Socialista, uma vez que o seu secretário-geral já afirmou diversas vezes que o seu partido concorrerá sempre sozinho a eleições. É que disto que se trata e não de uma outra efabulação obscura.

Assim, não entendemos como pode existir por parte do Bloco de Esquerda um “acordo de princípio” ou um “compromisso” para ser parte ativa numa solução desta natureza. Posicionamo-nos no campo diametralmente oposto.

6. O Partido Socialista não alterou o seu posicionamento político em relação às políticas de austeridade, muito pelo contrário, tem vindo a reafirmar o seu compromisso com elas, como é exemplo a sua defesa acrítica e militante do Tratado Orçamental, que veio garantir que o estado exceção do memorando da troika será a regra em Portugal nas próximas décadas. O PS, realmente existente, abandonou há muito o campo das políticas de esquerda, à semelhança dos seus parceiros franceses e italianos, que no Governo aplicam as mesmas receitas europeias que os governos de direita.

Tal como afirmámos na nossa Assembleia Fundadora, o nosso papel é o de contribuir para a construção do arco da alternativa, apesar de ainda minoritário, é o único caminho para a construção de uma política de rutura com o austeritarismo e que se comprometa com as vontades populares, que devolva direitos, salários e pensões e reconstrua o Estado Social. É tempo de ampliar o espaço político dos descontentes com os partidos do Bloco Central, de fixar proximidade com todos os setores predispostos para o protesto e expectantes de uma alternativa real.

 

Documento aprovado na reunião da Direção da Esquerda Alternativa.